Memória e verdade: Entrevista com Alejandra Naftal
Alejandra Naftal é diretora executiva do Museu Sítio de Memória Esma, da Argentina. Ela participa do penúltimo encontro do Webnário Memória e Verdade, falando da experiência argentina. Hoje, o Museu Sítio de Memória Esma é candidato a patrimônio imaterial da Unesco. Ao lado dela, estará o jurista Paulo Abrão, ex-secretário executivo da OEA, ex-presidente da Anistia e ex-secretário nacional da Justiça. A conversa será nesta terça (17), às 16h, transmitida pelo canal da Urca, no YouTube.
1. Quais os seus maiores desafios e perspectivas ao estar a frente de um espaço de memória como o Esma?
Em princípio, fique claro que é um espaço que resulta de consensos que se constroem no presente e que deve ser permanentemente validado. Por outro lado, também tem um olhar aberto para incluir novas vozes e que não seja um espaço entrincheirado, com uma história fixa, parada no tempo. Em vez disso, o que buscamos é o intercâmbio geracional, o diálogo, a reflexão e a pluralidade.
2. O Esma pode se tornar patrimônio da Unesco, o que traz uma projeção ainda maior para o museu, como você enxerga esse reconhecimento?
Conseguir esta candidatura seria um reconhecimento muito importante para meu país, mas também para a região da América Latina. Tem a ver com a possibilidade de reconhecer nossa história mundialmente, principalmente da região sul. E também tem a ver com o reconhecimento dos dois valores universais excepcionais que o definem: um negativo, no sentido de que a ESMA é o sítio mais representativo do terrorismo de estado baseado no desaparecimento forçado de pessoas. Mas também positivo, no que se refere ao consenso social como meio para alcançar a justiça, algo que foi gerado no calor da luta das organizações de direitos humanos pela Memória, Verdade e Justiça. A candidatura reforçaria a ideia do “Nunca Mais” e ajudaria perante as tentativas de alguns grupos – minoritários, mas aos quais devemos prestar atenção – de apagar a memória.
3. Como você avalia a contribuição de espaços como o Esma para a construção da memória e da democracia na América Latina?
A contribuição do Museu do Sítio de Memória Esma, assim como de todos os Sítios da Memória da Argentina, tem a ver com o fato de que se tornaram políticas de Estado em defesa dos direitos humanos e do direito dos povos à memória. São uma construção coletiva que se gera desde o presente e que contribui para o fortalecimento das democracias da América Latina, que já vemos padecer de importantes fragilidades.
4. Qual o dever da memória e a importância da ressignificação destes espaços de tortura e prisões?
Mais do que um dever, creio que como as memórias são construções do presente e vão mudando com a dinâmica de cada tempo, a importância está em ressignificar, re-representar e relocar esses lugares que foram lugares de tortura, horror e detenção ilegal, em espaços de verdadeira liberdade de expressão.
5. Quais ações podem nos conduzir aqui no Brasil a estar mais próximos deste resgate da memória e da verdade que vem sendo feito de forma tão pontual em países como Argentina, Chile , Uruguai e outros?
Todos os nossos países têm associações, organizações sociais, partidos políticos e militantes de diversas causas que nos momentos de fraqueza, quando não há vontade do Estado de valorizar as políticas da Memória, da Verdade e da Justiça, devem se unir e trabalhar em conjunto. Vimos que são essas organizações que realizam as ações e temos que fortalecer isso.